APONTAMENTOS SOBRE O INGRESSO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO
O presente trabalho não tem a intenção de exaurir ou mesmo descer a minúcias no estudo do contrato de locação de bens imóveis, previsto na Lei nº 8.245/1991, a chamada Lei do Inquilinato, mas apresentar, ainda que de forma sucinta, as possibilidades de seu ingresso no registro imobiliário. São apresentadas as averbações do direito e preferência, da caução locatícia e do registro de vigência.
1. DO CONTRATO DE LOCAÇÃO DE BENS IMÓVEIS
São inúmeras as estipulações possíveis no contrato de locação de bem imóvel, como a natureza da contraprestação por parte do locatário ou o bem ou os bens a serem dados em garantia, assim como eventuais cláusulas especiais.
No entanto, é necessária a sua conceituação, ainda que perfunctória. E nesse sentido, Venosa diz o seguinte:
A locação é, portanto, contrato bilateral e comutativo, a ela sendo aplicável o princípio da exceção do contrato não cumprido dos arts. 476 e 477. Existem obrigações recíprocas para ambas as partes. É onerosa porque importa em vantagem e sacrifício para as partes. Se a cessão da coisa é gratuita, tipifica-se como comodato. (VENOSA, p. 127, 2011)
Do que expõe o eminente jurista, há que se extrair o que, pela própria natureza do contrato, cria obrigações e, sobretudo, direitos às partes. E dentre os direitos e obrigações que têm como veículo o contrato de locação e que são passíveis de ingresso no registro imobiliário estão: o registro para fins de vigência, a averbação da caução e a averbação para fins de preferência.
É importante, por fim, ressaltar que o ingresso do contrato no registro imobiliário depende da existência de uma ou outra das cláusulas que serão tratadas. Já o seu registro para fins exclusivamente de publicidade será feito no Cartório de Registro de Títulos e Documentos e não no registro imobiliário, como se extrai do art. 129, 1º, da Lei 6.015/73, “Art. 129. Estão sujeitos a registro, no Registro de Títulos e Documentos, para surtir efeitos em relação a terceiros: 1º) os contratos de locação de prédios, sem prejuízo do disposto do artigo 167, I, nº 3;” (BRASIL, 1973).
1.1 Do registro da vigência
Para o registro da cláusula de vigência é imprescindível que o imóvel esteja matriculado, como determina o art. 176, §1º, I, da Lei 6.015/1973, isso porque, nos termos do referido diploma legal, o primeiro registro a ser realizado na sua vigência dará ensejo à abertura da matrícula.
Art. 176 – O Livro nº 2 – Registro Geral – será destinado, à matrícula dos imóveis e ao registro ou averbação dos atos relacionados no art. 167 e não atribuídos ao Livro nº 3.
§ 1º A escrituração do Livro nº 2 obedecerá às seguintes normas:
I – cada imóvel terá matrícula própria, que será aberta por ocasião do primeiro registro a ser feito na vigência desta Lei; (BRASIL, 1973)
Assim, um dos pontos precípuos a serem observados é se o imóvel pertence àquela circunscrição e se possui matrícula. Já em relação à elaboração do contrato, nos termos do art. 8º, da Lei 8.245/1991, é imprescindível a existência da cláusula de vigência.
Art. 8º Se o imóvel for alienado durante a locação, o adquirente poderá denunciar o contrato, com o prazo de noventa dias para a desocupação, salvo se a locação for por tempo determinado e o contrato contiver cláusula de vigência em caso de alienação e estiver averbado junto à matrícula do imóvel.
§ 1º Idêntico direito terá o promissário comprador e o promissário cessionário, em caráter irrevogável, com imissão na posse do imóvel e título registrado junto à matrícula do mesmo.
§ 2º A denúncia deverá ser exercitada no prazo de noventa dias contados do registro da venda ou do compromisso, presumindo – se, após esse prazo, a concordância na manutenção da locação. (BRASIL, 1991)
A cláusula de vigência de que trata o referido artigo não é a simples estipulação dos termos inicial e final da locação, mas o compromisso entre as partes quanto ao respeito à sua vigência em caso de alienação. E essa cláusula, apesar de estipulada apenas entre locador e locatário, poderá ser oposta perante um eventual adquirente, desde que previamente registrada na matrícula do imóvel.
1.2 Da averbação de preferência
A averbação do direito de preferência e, por conseguinte, a sua oposição contra terceiros, independe de cláusula expressa no contrato. É presumida, portanto, e, desde que previamente averbada no registro imobiliário, dá ao locatário o direito de exigir do locador, em igualdade de condições com terceiros, a aquisição do imóvel locado, quando este tenha sido oferecido à venda.
Art. 33. O locatário preterido no seu direito de preferência poderá reclamar do alienante as perdas e danos ou, depositando o preço e demais despesas do ato de transferência, haver para si o imóvel locado, se o requerer no prazo de seis meses, a contar do registro do ato no cartório de imóveis, desde que o contrato de locação esteja averbado pelo menos trinta dias antes da alienação junto à matrícula do imóvel. (BRASIL, 1991)
Por ser a cláusula de preferência objeto de averbação, o seu lançamento poderá ser feito em matrícula própria ou em transcrição, vez que a imprescindibilidade da matrícula se dá quanto ao registro realizado na vigência da Lei 6.015/1973, mas não em relação a atos de averbação.
Em consequência disso, a averbação do direito de preferência poderá ser feita em cartório distinto daquele responsável pela circunscrição em que o imóvel está situado. E é imperioso destacar que essa averbação só poderá ser feita na hipótese de o registro da aquisição do imóvel pelo locador ter sido feito sob a égide do sistema registral anterior. Nesse sentido dispõe o art. 823, do Provimento 260/CGJ/2013.
Art. 823. As averbações serão efetuadas na matrícula ou à margem da transcrição ou inscrição a que se referirem, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer a outra circunscrição.
Parágrafo único. Fica vedada a prática de novos atos após o recebimento de comunicação de abertura de matrícula para o imóvel na serventia de sua nova circunscrição. (MINAS GERAIS, 2013)
Assim, se aberta a matrícula em outra serventia, a averbação do direito de preferência será nela realizada, ainda que o proprietário se mantenha o mesmo.
1.3 Da caução locatícia
A caução locatícia é modalidade de garantia prevista na Lei 8.245/1991 e tem por finalidade resguardar o direito do locador ao recebimento dos alugueis. Está inserida entre três outras modalidades de garantia, quais sejam, a fiança, o seguro de fiança locatícia e a cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento, que não serão objeto registro ou averbação no registro de imóveis.
Art. 37. No contrato de locação, pode o locador exigir do locatário as seguintes modalidades de garantia:
I – caução;
II – fiança;
III – seguro de fiança locatícia.
IV – cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)
Parágrafo único. É vedada, sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo contrato de locação.
Art. 38. A caução poderá ser em bens móveis ou imóveis.
- 1º A caução em bens móveis deverá ser registrada em cartório de títulos e documentos; a em bens imóveis deverá ser averbada à margem da respectiva matrícula.
- 2º A caução em dinheiro, que não poderá exceder o equivalente a três meses de aluguel, será depositada em caderneta de poupança, autorizada, pelo Poder Público e por ele regulamentada, revertendo em benefício do locatário todas as vantagens dela decorrentes por ocasião do levantamento da soma respectiva.
- 3º A caução em títulos e ações deverá ser substituída, no prazo de trinta dias, em caso de concordata, falência ou liquidação das sociedades emissoras. (BRASIL, 1991)
Como visto, a caução de bens móveis será registrada no cartório de registro de títulos e documentos, enquanto a de bens imóveis será averbada na respectiva matrícula ou transcrição, da mesma forma e sob os mesmos argumentos que o direito de preferência. É importante ressaltar que o ato será lançado na matrícula ou transcrição do imóvel dado em garantia e não daquele objeto da locação.
A averbação da caução locatícia não constitui direito real sobre o imóvel, tratando-se apenas de garantia pessoal. Essa regra, no entanto, se refere a seu gênero, pois, se constituída em uma das suas espécies, hipoteca ou alienação fiduciária, terá ela natureza real e será, por consequência, objeto de registro.
- CONSIDERAÇÕES FINAIS
O ingresso do contrato de locação no registro de imóveis se restringe a um número limitado de hipóteses e a cada uma delas e destinado um tratamento distinto. São constituídos direitos e obrigações, cuja publicidade e oposição a terceiros são garantidos.
Desde a mais simples das averbações, como a preferência, à mais complexa e de maior vulto patrimonial, como a caução locatícia com garantia real ou mesmo a vigência, o contrato de locação, recorrente no meio negocial, ganha maior segurança e estabilidade entre os contratantes.