A capacidade contributiva e os impactos econômicos decorrentes das medidas de tentativa de contenção do COVID-19
Embora uma das principais características da grave crise do sistema de saúde e econômico diz respeito à sua temporariedade, uma vez que se trata de uma pandemia que, a princípio, possui começo, meio e fim, a situação financeira de várias empresas vem sendo subitamente agravada em decorrência das medidas que têm sido adotadas para a contenção da propagação da Covid-19: isolamento social, quarentena, fechamento de estabelecimentos e locais públicos ou acessíveis ao público, tais como comércio em geral, setor de serviços e setores industriais considerados não essenciais.
Com a paralisação do ciclo de produção, diversas empresas tiveram o seu fluxo de faturamento interrompido, com o consequente comprometimento da sua capacidade de cumprir as diversas obrigações financeiras e fiscais inerentes à atividade econômica.
O próprio Decreto Legislativo nº 6 de 20 de março de 2020, fez prever que o Governo Federal estaria dispensado de cumprir a meta fiscal para o ano de 2019, para destinar recursos financeiros ao combate da pandemia causada pelo novo Coronavírus.
A seu turno, tem-se que a capacidade contributiva foi inserida no artigo 145, parágrafo 1º do texto constitucional e recebeu o seguinte enunciado:
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
(...)
§1º – Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
Portanto, o próprio legislador constitucional fornece os mecanismos que deverão ser adotados para viabilizar a arrecadação tributária, mormente de acordo com a realidade e individualidade.
Sobre o assunto a ilustre Professora Misabel Derzi (2004, p. 109) entende que:
a capacidade econômica de contribuir às despesas do Estado é aquela que se define após a dedução dos gastos necessários à aquisição, à produção e à manutenção da renda e do patrimônio, assim como do mínimo indispensável a uma existência digna para o contribuinte e sua família. Tais parcelas, correspondentes a tal passivo, não configuram capacidade econômica, assim como o seu ferimento pelo tributo terá efeito confiscatório de renda ou do patrimônio.
Portanto, a capacidade contributiva é o princípio constitucional que garante o direito de o cidadão ser tributado dentro da sua realidade e individualidade, de tal modo que o poder impositivo não restrinja ou aniquile o mínimo vital ou existencial e que nem possua efeito confiscatório, e que impõe o dever de todos os indivíduos repassarem proporcionalmente aos cofres públicos parte do saldo de sua riqueza.
A situação atual demanda uma atuação positiva e integrada dos três Poderes da Federação no sentido de dar concretude e efetividade ao princípio da capacidade econômica/contributiva (art. 145, §1º, da CF/88).
No âmbito judicial, tendo em vista a omissão dos Poderes Legislativo e Executivo sobre o tema, noticia-se a concessão de liminares postergando o vencimento de tributos com o fim de preservar a atividade empresarial e assegurar a solvibilidade das grandes empresas.
Em verdade a concessão de postergação do vencimento dos tributos constitui interesse de toda a coletividade, uma vez que tal ato não só respeita a capacidade contributiva dessas empresas, que tiveram suas atividades interrompidas pelas medidas de contenção do COVID-19, mas também atende a disposição constitucional (art. 145, §1º, da CF/88) de observação da capacidade contributiva, constituindo meio de preservar os postos de trabalho e o pagamento de salários e compromissos com a cadeia de fornecedores, assegurando que todos os envolvidos no ciclo produtivo não fiquem desamparados.
Bianca Modafferi
Pós graduanda em Direito Tributário pela Faculdade CEDIN.